Foto de época do arquivo de Zilda Stangherlin dimensiona um dos desafios enfrentados pelos pioneiros do Vale do Seringal
A foto, já colorida e restaurada, em destaque neste texto, não mostra o barro grudando nos pés nem o zumbido incessante dos piuns – aqueles mosquitos que pareciam desafiar o sol do meio-dia. Mas está ali, implícito, na poeira levantada pelas máquinas e nos rostos marcados pelo cansaço. Era assim o cotidiano daqueles que desbravaram o Vale do Seringal, em Castanheira (MT), nos anos 90: suor, terra e perseverança.
“Era uma coisa bruta. Não tinha estrada. A gente aproveitava o caminho feito pelos caminhões de madeireiras”, recordou, em vida, o saudoso Ivan Justino, um dos motoristas que levava os pioneiros, em reportagem da Revista Innovare. E quando as chuvas chegavam, os mesmos trilhos que serviam de passagem viravam atoleiros, transformando cada ida a cidade, cada busca por ajuda, numa batalha contra a lama. À noite, sem energia elétrica, só restava a luz de lamparinas e a certeza de que, no dia seguinte, o trabalho recomeçaria.
Mas foi ali, entre picadas abertas no mato e picadas de insetos, que as primeiras estradas vicinais começaram a surgir. Articuladas pelo então prefeito Dr. Jorge Luiz Arcos e financiadas pela Caixa Econômica Federal, num projeto do INCRA, essas vias eram mais do que terra batida – eram o cordão umbilical ligando os assentamentos I, II, III e IV ao futuro. A foto de 1997, guardada pela ex-prefeita Zilda Stangherlin, captura um instante dessa epopeia: um horizonte que, pouco a pouco, se abria.
Em fevereiro de 2000, uma das primeiras vicinais era concluída, custando R$ 55.661,92 , com contrapartida de R$ 2.661,92 do município – valor que não incluía o preço das noites mal dormidas nem dos pés inchados de tanto pisar em solo hostil. Mas, como escreveu alguém “Quando acreditamos que tudo está perdido, surge a esperança.” E ela veio, em forma de caminhões carregados de produção, de crianças indo para a escola a pé, bicicleta ou na carroceria de alguma caminhonete, de famílias finalmente conectadas.
Hoje, décadas depois, essas estradas são veias que sustentam a agricultura familiar do Vale do Seringal. A foto é só um registro, mas quem viveu aqueles dias sabe: cada curva desse chão guarda histórias de quem ousou transformar o barro em progresso.